A poesia ecoava nas paredes antigas evocando lembranças que não viveram. A literatura nos remete às vidas que não nos pertencem, a momentos que não são nossos, e nos fazem reviver memórias que nunca tivemos. E é assim, de passo em passo que contemplamos o passar dos dias. As letras voam entre os poemas e nos agarram para nos dar novos sentidos.

“Tenho em mim todos os sonhos do mundo”, versejava Fernando Pessoa. E transformar o mundo em versos é deixar fluir os sentidos. Incorporar, inspirar, deixar levar, deixar ser. E como o saudoso poeta cuiabano Antônio Sodré, a poesia é a sua musa, que se apodera de si, mero instrumento para traduzir o canto dos seus encantos.

E ainda citando Fernando Pessoa “escrever é esquecer”. E através da escrita todas as dores, males, dissabores, se esvanecem ao vento. Fazer deste mais que um labor diário, uma missão, um sentido de vida, nesta vida sem sentidos. E a poesia se eleva, se faz grande, gigante, engole e esvazia, e assim que se vai, deixa o vazio, um abismo, e para recuperar qualquer sentido em viver, basta voltar a máquina e apenas deixar fluir.

“Estas palavras que escrevo me afastam da loucura total”, verso de Bukowski, afinal, um texto não é apenas um texto, é a incorporação de todos os grandes escritores que já viveram. Os dedos são meros instrumentos que sequer conseguem acompanhar o turbilhão dos pensamentos. Viver é poesia, deixar livre, deixar ser o que quer que o poema seja.

E entre os amores, as dores, e até a latrina, tudo vira poesia.

“arranje uma grande máquina de escrever,
e assim como os passos que sobem e descem
do lado de fora de sua janela
bata na máquina
bata forte

faça disso um combate de pesos pesados

faça como o touro no momento do primeiro ataque

e lembre dos velhos cães
que brigavam tão bem:
Hemingway, Céline, Dostoiévski, Hamsun.

se você pensa que eles ficaram loucos
em quartos apertados
assim como este em que agora você está

sem mulheres
sem comida
sem esperança

então você não está pronto.

beba mais cerveja.
há tempo.
e se não há
está tudo certo
também”

Como ser um grande escritor – Charles Bukowski.