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Domingo, 05 de maio de 2024

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Melodrama belga é um barco balançando no mar

Arquivo Pessoal

Indicado ao Oscar como melhor filme estrangeiro, o melodrama belga Alabama Monroe, lançado em 2013, também foi eleito pelo júri popular o melhor filme do Festival de Berlim. Trata-se de uma adaptação do texto dramatúrgico do ator Johan Heldenbergh. Em tempos de divergências intermináveis entre os autores de obras originais e adaptadores no cinema, o longa não corre tal risco, pois Heldenbergh é responsável pela interpretação do papel protagonista.

A trama se desenvolve através do romance pouco convencional entre a tatuadora Elise (Veerle Baetens) e o cowboy Didier (Heldenbergh), que toma doses exacerbadas de yanquefilia, e ganha a vida tocando com sua banda de bluegrass, um estilo musical influenciado, ou influenciador, do country. Eles têm uma filha, de gravidez indesejada, Maybelle (Nell Cattrysse), que desenvolve câncer. Eis aí uma receita manjada para pesar em toneladas a carga dramática da história. Lágrimas certas. É quase desonesto por parte do diretor Felix van Groeningen.

A música está presente em todos os momentos, deve ser perdoado quem definir o gênero de Alabama Monroe como musical. Contudo, são nos momentos de total supressão do som que são atingidos os ápices desejados no filme.

É observando estes pontos altos que notamos a maneira interessante em que o filme é montado. Alterna, quase que religiosamente, cenas de euforia e depressão. Hora o casal briga, hora transa. Hora a menina sorri encantadora, hora chora por não compreender a morte, como na cena em que tem o cadáver de um pássaro nas mãos, mas à frente tem a figura paterna com seu ceticismo insensível. Ao que me parece, o intento era manter as tensões do público sempre em alerta após alguns momentos de riso ou encantamento. Esta reestruturação da narrativa poderia soar melhor se não caísse na monotonia, gasta pelo uso, acabando por se revelar uma ousadia ingrata para Van Groenigen.

Algumas questões ficam mais confusas do que deveriam, tem-se, por exemplo, a impressão de não perceber a evolução de Didier. O personagem já no final do filme traz à discussão um tema nada banal como influência da religião na evolução da ciência, mas especificamente, no truncamento que o governo estadunidense dá às pesquisas com célula-tronco. O cume da revolta de Didier ocorre durante uma apresentação, no final de uma música ele emenda um discurso pouco crível, e até mal escrito, a sua euforia é incapaz de salvar o longa de seu pior momento. Talvez fosse necessário mais tempo para o personagem enfim explodir.

É como uma pequena embarcação no meio do mar. Alabama Monroe vai e vêm em movimentos quase infinitos. Também como a pequena embarcação no meio do mar pode trazer o êxtase e a náusea aos seus tripulantes por tanto balançar.

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