Olhar Conceito

Sexta-feira, 03 de maio de 2024

Colunas

Máquina do Tempo

Um dia disseram que a câmera fotográfica é o artefato mais próximo da máquina do tempo. O sábio autor dessa frase não poderia estar mais certo. Nessa enxurrada de imagens fugazes e passageiras que inundam a web, pouca gente percebe, mas o grande poder da fotografia não é a combinação de linhas, a luz perfeita, composição e tantos outros termos que nós, amantes dessa arte, estamos acostumados a estudar e praticar. O maior poder da fotografia é a preservação da memória. O milagre do congelamento do tempo.

Através da fotografia, podemos matar a saudade de quem já se foi, lembrar aquele aniversário inesquecível, cheio de gente que hoje mora longe. Podemos recordar um amor antigo ou rasgar a foto para esquecer tudo. Através da fotografia, uma garota pode estar presente no casamento de seus pais, quando ela sequer existia. Podemos lembrar daquela viagem até quase sentir o cheiro do mar e das montanhas que um dia percorremos. Lembrar que já fomos mais felizes, que o tempo de tristeza imensa finalmente passou e rir das roupas e cortes de cabelo que eram moda na década passada. A fotografia faz com que a história permaneça história e não vire lenda.


(Na foto, minha avó Elly segura uma foto em que aparecem ela e meu avô, ainda namorados, aos 24 anos. Os dois completaram 80 há poucos meses) 

No entanto, quase ninguém lembra do poder da memória na hora do clique. Natural, já que nossos cérebros vivem muito mais no presente. Como fotógrafo, vejo trabalhos de fotografia de família e casamentos cada vez mais padronizados. As mesmas poses, a mesma foto do casal se beijando no bosque com o fundo desfocado. Ou então mega-produções, com carros de luxo alugados e cenários meticulosamente preparados. Preocupações estéticas excessivas. Mas quanto essas imagens realmente dizem sobre as pessoas que estão ali? Daqui a 20 ou 30 anos, aquela foto de poses pré-definidas, num cenário bonito mas irrelevante, dirá algo sobre o dia, o a época, os sentimentos? O perigo é descobrir que não, só daqui a 20 ou 30 anos.

*Lucas Ninno é fotógrafo e editor da agência Alvorada Imagens.

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