Olhar Conceito

Quinta-feira, 18 de abril de 2024

Colunas

A fotografia como ela é

Desde que comecei a me enveredar pelas trilhas da fotografia, um dos estilos que mais me fascina é o retrato. Nem tanto pela beleza estética, mas pela força emocional. Pela possibilidade de se olhar nos olhos, ato primitivo de conexão entre humanos.

Um bebê, poucos dias depois de nascer, tem dificuldade em movimentar pernas, braços e a cabeça. Mas os olhos, uma vez abertos, sondam todo o ambiente e pousam direto e reto nos olhos de outros humanos. É a melhor forma que o pequeno encontra para conhecer seus semelhantes. E assim é com um bom retrato. A história sai dos olhos. O coração se vê nos olhos.

Mais que obter o resultado - uma boa foto -, meu grande prazer é o processo de produção desse tipo de imagem. E nada tem a ver com câmeras, flashes ou lentes. O tesão da coisa é o poder dessa conexão entre meu olhar e o olhar do fotografado. Como tímido assumido que sou, sempre me custou olhar diretamente para alguém, seja quem for. A fotografia mudou isso em mim. Travei contato com olhos de amigos, amores, gente humilde e gente muito poderosa, de uma maneira verdadeira e forte. E pude ver, ao menos um pedaço de suas almas e corações por esta mesma via.

É certo que do lado de lá, também não é fácil. Se ninguém abre a porta de casa para um estranho, imagine as janelas da alma. Para entrar, é preciso ser convidado. Afinal, o coração é área vip. Tudo ali é caro e se quebra muito fácil. Mas também é bonito de se ver.

Parte do que vi virou fotografia e a outra parte, ficou guardada comigo nessa caixa de sentimentos impossíveis de etiquetar. Alguns desses olhos até já se fecharam para sempre. Quanta vida havia ali! A parte boa é que estes olhares ficarão aí, guardados, contrariando a fugacidade do mundo real, onde entre estranhos a mirada se esvai para os lados depois de alguns segundos. A fotografia, ainda bem, preserva essa aquela fração de tempo e nos deixar olhar uma, e outra e outra e outra vez, até o dia em que nossos próprios olhos resolvam descansar.

*Lucas Ninno é fotógrafo e editor da agência Alvorada Imagens.



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