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Segunda-feira, 06 de maio de 2024

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Câmeras e barricadas

Autor: Felippy Damian - Especial para o Olhar Conceito

19 Jun 2013 - 10:35

Um compilado de imagens gravadas pelo mundo por pessoas distintas e até anônimas tem mais em comum do que a locução em off que centraliza a narrativa de "Brad, uma noite mais nas barricadas", 2007, de Miguel (é como diretor assina os créditos). O roteiro, escrito para contar a história do jornalista americano Brad Will, conta também sobre a necessidade popular ignorada em vários lugares do globo de ver suas manifestações publicadas pelos meios de comunicação, ou como o documentário justifica a sua existência “esse filme nasce da dificuldade de saber o que dizer e da extrema necessidade de dizer alguma coisa”.

E como não dizer nada diante do momento histórico vivido no Brasil, quando a população toma as ruas com propriedade absoluta em diversas cidades do país. O movimento ainda acéfalo, por se construído horizontalmente plural, sofre e deve sofrer com investidas oportunistas do bloco de partidos que se opõe ao governo, e principalmente de grandes meios de comunicação. Os mesmos meios que negaram espaços concedidos de forma emergencial por Brad Will e os demais militantes do CMI (Centro de Mídia Independente) no mundo e por aqui.

A figura de Arnaldo Jabor sintetiza bem essa mídia que ainda não compreendeu a construção do processo. O jornalista retalhou e em seguida se retratou levantando uma bandeira de mea culpa com uma atuação cênica ridícula e pouco crível. O próprio Jabor enquanto diretor de cinema não se contrataria.

Bem mais real que o articulista global é Brad Will, agitador, ele levava o conceito de ação direta ao pé da letra. Foi assim que ele viajou a América Latina, e no Brasil participou de diversas ações como no episódio do Sonho Real, em Goiânia, quando moradores sem-teto foram desabrigados com violência terrorista pela polícia local.

Seria, no entanto, impossível que outro episódio se destacasse mais no filme que a revolta em Oaxaca no México. Populares derrubam Ulisses Ruiz, seu governador, e instauram uma assembleia popular, legitimada pelo desaparecimento de poderes previsto pela sua constituição. Fascinado Brad é atraído para lá a fim de documentar o levante, e assim o faz, morrendo com a câmera na mão pelas armas dos paramilitares contratados para restaurar a ordem conveniente ao grupo de Ulisses. A cena até chega a ser sutil, pois não se pode ver o corpo e nem sequer o sangue do militante, bem distante dos apelos sensacionalistas.


O ativista, Brad Will

Por ter tantas características coletivas, quanto a captação e as causas das ações nas imagens, fica um tanto incoerente a avaliação técnica ou estética do média-metragem. É com certeza o trabalho menos autoral já criticado nesta coluna. O filme não tem a cara do Brad Will, e também não tem a cara do Miguel. E justamente por não ter a cara de ninguém tem a cara de todos. Pode até ser acusado de panfletário e propagandista. Mas a sua independência, na produção e distribuição, que tem as suas câmeras posicionadas nas barricadas, melhor o rotularia como contrapropagandista. Um filme de luta.

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