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Sexta-feira, 19 de abril de 2024

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primeira parte

Muito além do 'Vem pra Arena': Em entrevista exclusiva, Leandro Carvalho faz balanço da gestão e comemora resultados

Foto: Rogério Florentino Pereira / Olhar Direto

Leandro Carvalho

Leandro Carvalho

Neste final de ano, o Olhar Conceito fez uma entrevista extensa com o Secretário de Cultura Leandro Carvalho. Leandro fez um balanço sobre os dois anos de gestão, comentou os principais programas, as dificuldades, e falou ainda sobre os planos para os próximos anos. Neste domingo, e nos próximos dois, você confere na íntegra o bate-papo. 

Na primeira parte (relatada abaixo), Leandro falou sobre o Circuito de Festivais de Teatro, sobre a nova gestão do Cine Teatro, comentou a polêmica acerca da Mostra de Cinema Negro e sobre o porque do cancelamento do 'Vem pra Arena' de natal. Confira:

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Olhar Conceito – Dois anos de gestão, o que você acha que está certo, e onde ainda pode melhorar?

Leandro Carvalho – Eu fui convidado para assumir a Secretaria, pelo governador, dia 26 de dezembro de 2014, e uma semana depois eu era o secretário de cultura, esporte e lazer. Dez meses depois a cultura voltou a ser uma secretaria exclusiva, e eu acho que isso é uma demonstração clara da importância que a cultura tem na agenda política atual. Nós começamos a gestão com a consulta pública dos Marcos Legais, e eu acho que isso é uma conquista muito importante, porque são ações estruturantes pra área. Nós abrimos para uma nova consulta pública do Plano Estadual, que é um plano que já havia sido construído com um diálogo muito amplo nos últimos dois anos, e simultaneamente com o Plano fizemos o Sistema Estadual, o Fundo e o Conselho. Consolidamos esse debate com a sociedade em várias partes de Mato Grosso, enviamos para a Casa Civil, Assembleia, e as leis foram aprovadas. Receberam emendas que contribuíram muito pro conceito e o governador sancionou no início do ano. Então esses são avanços extraordinários. Sem entrar em detalhes, cada lei representa uma grande conquista. Por exemplo, a Lei do Fundo tem a grande conquista da vinculação do orçamento do fundo com a receita tributária líquida até 0,5. (...) E eu acho que uma das grandes conquistas é a descentralização, ser uma Secretaria de Estado realmente, o que era uma reivindicação muito grande, da Secretaria operar pensando no Estado, necessariamente ter ações políticas estruturantes que garantam o percentual significativo pro interior, estão nas leis essa garantia. A partir daí nós passamos a criar programas, que foram realizados ano passado e neste ano, mais recentemente o Circuito de Festivais de Teatro, a criação dessa rede de festivais, do fortalecimento de cada Companhia de teatro, cada escola do interior, cada iniciativa. (...) O Estado fomenta, ele cria o espaço adequado ao desenvolvimento.

OC – Os Festivais já existiam, eles foram apenas integrados à rede?


Leandro –
Sim, o Estado chamou todo mundo pra mesma mesa: Gente, vem aqui, vamos criar uma rede, vamos criar um circuito, vamos otimizar os investimentos, se aproximar, dialogar?

OC- Quais eram os principais pedidos de cada um?


Leandro –
Eles queriam ser ouvidos. Eles queriam integrar as políticas públicas estaduais. O Femut, por exemplo, acontece há 15 anos. O Teatro Ogan tem vinte anos, imagina? É em Campo Novo, Campo Novo não tem nem 30 anos, a cidade, e a Companhia de Teatro tem 21 anos. Teaf [Teatro Experimental de Alta Floresta] tem 28 anos, a cidade de Alta Floresta tem trinta e poucos anos. Teatro Faces, que fez o Velha Joana agora, está no décimo ano de Velha Joana, e o Teatro Faces tem uma escola de teatro em Primavera, além da Mit, Humor do Mato, no oitavo ano, e o Zé Bolo Flô, que está no terceiro ano. O mais novinho é o Zé Bolo Flô, mas tem essa desenvoltura de levar o teatro pras ruas, pras praças. E a gente tem uma comunicação integrada, então o grupo de comunicação é o mesmo que percorre todos os festivais. (...) E esse ano aconteceu uma coisa muito bonita que é o intercâmbio de companhias de Mato Grosso. Mato Grosso é um mundo que precisa se integrar.

Nesse contexto das artes cênicas, especificamente, tem a Escola de Teatro, com esse foco profissionalizante das profissões técnicas, então você tem os cursos de direção, de atuação, mas tem de sonoplastia, tem figurino, tem cenário, tem outras áreas que o mercado precisa, principalmente do interior. E não só o mercado do teatro, mas dos hoteis, dos centros de convenção, da cadeia do turismo.

OC – Você fala do interior, mas as aulas serão no Cine Teatro

Leandro – As aulas serão também no interior. Os cursos de intensão já vão acontecer nos pólos: Campo Novo, Primavera e Alta Floresta. Inicialmente. A gente pretende ampliar, mas a gente não tem fôlego, vamos começar com os lugares onde as companhias já são atuantes e já tem os festivais. (...)

OC – E porque a escolha da parceria com a SP Escola de Teatro?

Leandro –
Na verdade não foi uma escolha nossa. A gente fez um chamamento público, e foi o Cena Onze que articulou. A proposta do Cena Onze veio interligada com o SP. Todo mundo conhece o SP, inclusive o Ivan Cabral, que é um dos criadores da Companhia Satyrus já esteve aqui conosco no ano passado, e a gente tava construindo, a gente queria oferecer, trazer a metodologia deles. (...) E eles já trouxeram o design da Finlândia, no lançamento da Escola a gente já assinou o documento com o design da Finlândia. Então no início do ano que vem os professores da Finlândia já vem pra cá dar aula na escola, e a ideia é que os alunos e professores daqui também vão para a Finlândia. (...) É uma área que em Mato Grosso já era muito organizada, muito desenvolvida, então a gente procurou criar um espaço de intercâmbio, fomento e potencialização. E eu acho que aí vem também uma característica nossa [da Secretaria]. Algumas coisas a gente cria, mas a gente tem que ter a sensibilidade de reconhecer as coisas importantes, e que dão certo, e que são uma tradição importante da cultura mato-grossense.

OC – Por exemplo?


Leandro - A gente poderia citar o Salão Jovem Arte, que estava há oito anos inativo. Então, indo pras artes plásticas a gente tem a retomada de ações importantes, como o Salão, e a novidade de novas exposições, como a Bienal de São Paulo, uma das três maiores exposições de arte contemporânea do mundo.

OC – Vocês vão trazer todas as edições?

Leandro –
Sim, no início do ano já vem a que está em cartaz em São Paulo agora. Então já começa a colocar Mato Grosso dentro desse contexto de arte contemporânea. Além da exposição, as oficinas, o intercâmbio de artistas, educacional.

OC – Você citou o Salão Jovem Arte, e é o mesmo caso do Cine Teatro, que ficou um grande tempo fechado. Porque você acha que demorou tanto pra reabrir?

Leandro –
Quando a gente assumiu já estava fechado. A gente fez dois chamamentos, e os dois foram frustrados, cada um por sua razão. Eu acho que nós tivemos um problema inicial com a qualificação do Sesi, e aí o segundo certame não teve nenhuma organização qualificada. Eu acho que isso nos obrigou a repensar o conceito do teatro. E foi dessa frustração que nasceu a ideia do teatro-escola.

OC – E foi só depois de repensar essa forma que o Cena Onze entrou?


Leandro – Foi só depois de repensar o conceito que o Cena Onze concorreu, e nesse certame que o Cena Onze venceu, foram só duas instituições qualificadas. A pontuação do Cena Onze, junto com a SP, foi maior, e ficamos felizes porque o teatro reabriu.

OC – E desde que reabriu, como você avalia as atividades que vem acontecendo lá?

Leandro – Eu acho que esse primeiro semestre foi um semestre de estruturação, eles nunca geriram um teatro antes, está havendo uma curva de aprendizado. Eles estão tomando pé da dinâmica da gestão de um teatro. Eu acho que foi positivo a escola não acontecer simultaneamente, porque primeiro eles estão lidando com questões relativas ao teatro propriamente, e a difusão, a bilheteria, fluxo de pessoas, o relacionamento com produtores, com diferentes espetáculos, enfim. Tem toda uma problemática dali, acho que se está começando a construir uma nova identidade para o teatro. E a partir do ano que vem, com o uso do cinema também, que é uma novidade.

Esse primeiro semestre foi um momento também de aprender as questões relativas ao audiovisual. E a partir de fevereiro do ano que vem já funcionando como escola, como espaço de difusão audiovisual, de cinema, e o próprio teatro mesmo, com uma programação regular.

OC – Como você enxerga o problema que aconteceu com a Mostra de Cinema Negro? Toda a polêmica, as pessoas que receberam isso de outra forma. Você acha que foi um erro?

Leandro – Eu acho que houve um erro inicial, e acho que houve algumas escolhas infelizes, desnecessárias, como aquele painel, com aquele título [Referência ao painel que inicialmente se chamava ‘Deu Branco’, com filmes de cineastas brancos]. Acho que foi desnecessário, poderia ter tido outro nome. Eu não vejo má fé de nenhuma das partes, eu acho que estavam todos ali querendo fazer alguma coisa bonita, alguma coisa especial, que somasse no mês da Consciência Negra. Eu quero olhar pra frente. Quero tirar uma lição dessa experiência, que foi bastante polêmica, quero extrair um aprendizado. Acho que serviu pra gente se aproximar, pra gente sentar, e pra ficar claro que o debate é necessário, que o diálogo é necessário, que a gente precisa realmente ter a consciência de que existe, ainda hoje, um preconceito tremendo e que existe uma produção de muita qualidade sendo feita por profissionais de várias modalidades do audiovisual, e que isso pode ser uma grande oportunidade pra gente avançar a partir daí. Acho que a gente precisa não alimentar nenhum tipo de ódio, porque a gente já vive num ambiente extremamente hostil que a vida nos coloca. Todo mundo acorda cedo e vai lutar pra sobreviver, né? Cada um a seu modo de atuação. Então nós não precisamos de mais conflito, de mais ódio, de mais agressão. A gente precisa de diálogo e de perspectivas motivadoras pra que a gente supere as diferenças. (...). A mostra vai acontecer, ela foi toda redesenhada, toda replanejada.

OC – E quais foram as mudanças?

Leandro – Mudança de programação. Buscou-se fazer as alterações necessárias a partir do debate. O debate estava muito bem encaminhado na reunião fatídica, que aconteceu no dia 11 [de novembro], mas no final dela começou uma briga, um bate-boca. Eu não estava presente, me relataram, e infelizmente aconteceu isso. Infelizmente, porque já estava tudo encaminhado. E a partir daí começou um conflito. Então eu acho que a gente não deve muito focar nisso.

OC – Então a lição que fica é da necessidade de mais diálogo?

Leandro – A gente dialoga muito. Não é querendo dizer que a gente não dialoga, porque todos os dias é o que a gente faz o dia inteiro, é conversar, ouvir. (...) Eu acho que nesse assunto, com relação ao movimento negro, às questões da cultura afro-brasileira, eu acho que a gente precisa sentar, conversar e construir uma agenda positiva pro futuro. A gente criou o Prêmio Tradições com esse foco, de fortalecer ações na área das tradições afro-brasileiras, quilombola, bem como dos povos tradicionais. Além desse aspecto, nós já estamos trabalhando no chamamento público pra Casa Cuiabana se tornar um centro de cultura popular tradicional.

OC – Mas no momento a Casa Cuiabana está funcionando. Qual seria a mudança?

Leandro – A mudança é potencializar aquele espaço. As ações da Casa Cuiabana ainda dependem da Secretaria, dos servidores. E não esse modelo que a gente acredita, porque a gente não pode abrir com frequência nos finais de semana, tem horários, a gente vais seguir os horários do servidor, e esses horários não coincidem com os horários que as pessoas tem de lazer. Como é o caso da Galeria Lavapés, porque ela fecha nos finais de semana. Ou seja, quando a pessoa tem tempo pra ir na galeria, ela ta fechada. Então por isso a gente quer fazer um chamamento público, pra gestão compartilhada, pra que fique aberto aos finais de semana, até mais tarde. (...) A Casa Cuiabana tem um dinamismo, que ali podem acontecer exposições, encontros, ocupações. O meu sonho ali é que todos os dias tenha algo. (...)

Além disso, a gente apoiou também todas as manifestações de cultura popular, inclusive a Festa do Congo, de Vila Bela, o ano passado e este ano. Eu faço uma menção especial também às Quadrilhas do Araguaia. Nós reestruturamos essa iniciativa e criamos o Festival de Quadrilhas do Araguaia. A gente reconstruiu esse formato em diálogo com os quadrilheiros, envolvendo mais de quinze municípios da região do Araguaia no passado. E este ano aconteceu de forma ampliada, incluindo a região Sul, em Rondonópolis. Foi um grande investimento ali, e movimentou toda a região. Eu te digo isso porque é importante a gente destacar a complexidade e a diversidade da cultura mato-grossense.

OC – Outro ponto que foi bastante importante nessa gestão foi a criação do ‘Vem pra Arena’. Como você enxerga todas essas edições?

Leandro – Foram nove edições. O Vem pra Arena é uma iniciativa que lida com um número muito grande de pessoas, estamos falando de uma média de 50 mil pessoas por final de semana, é uma novidade isso em Mato Grosso, ter um evento, dentro do âmbito da política pública estadual, que envolve um número tão grande de pessoas. A gente está falando de mais de cem artistas por edição, sendo remunerados de acordo com o mercado, com produção com o que tem de melhor de palco, som e luz, com toda a comunicação de massa do governo usada para atrair as pessoas para um evento cultural. São VTs passando em veículos de massa, televisões de grande circulação, além das redes sociais. Isso é novidade, a cultura nunca esteve tão no centro. E daí a impressão de que o Vem pra Arena é o mais importante. Não. O Vem pra Arena é mais uma das iniciativas, mas como ele ta numa categoria que vai pra TV, claro que ele tem mais visibilidade, porque é um evento de massa, mas não é que só se faz o Vem pra Arena. Tem milhões de outras coisas acontecendo, mas esse é um evento de massa, e a gente entende que é importante porque é uma forma de democratizar. A gente sabe a carência de opções que têm em Cuiabá pra você poder ir com sua família, com seus amigos, num lugar aberto, gratuito, com segurança.

Eu acho que o conceito do Vem pra Arena que pegou. Não é simplesmente assistir a um show, você vai viver uma experiência. Quem tem criança vai brincar, quem quiser patinar, quem quiser praticar esportes, quem quiser conhecer o campo, quem quiser ficar sentado ali dentro. A área é toda da economia criativa, os produtos orgânicos, as Feirinhas que você tem, como a da 24, com artesanato, moda, gastronomia, as exposições ao ar livre, as intervenções, as ocupações enfim, é uma multiplicidade. Essa experiência que eu acho que marcou.

OC – Já tem o nome de quem vem pro Especial de Natal?

Leandro – A Especial de Natal a gente não vai fazer pela crise. (...)

OC – E como vai ficar, com todo esse enxugamento de gastos, os projetos que a Secretaria tem?

Leandro – Na verdade a gente segue o nosso planejamento. A gente já está com todo o planejamento para 2017. Nós não poderemos crescer como gostaríamos, mas a gente não tem nenhuma perspectiva de fusão com outras secretarias, muito pelo contrário. A gente acabou de separar, não existe nenhum plano nem de extinção da secretaria, como vem acontecendo em outros estados, ou fusão com outras pastas.

OC – Tem alguma data pro ano que vem do Vem pra Arena?

Leandro –
Não, mas no começo do ano a gente vai anunciar a programação do ano, como fizemos esse ano. Porque as pessoas se organizam pra vir do interior pra capital. Quando a pessoa tem algum negócio a tratar, ou alguma viagem, alguma coisa que ela precisa, ela já se organiza pra vir nas datas do Vem pra Arena. A gente viu isso ao longo desse ano, a ocupação dos hoteis aumentou, a movimentação dos restaurantes, de taxi, enfim. Você movimenta a economia da cidade com um evento dessa envergadura.
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