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Quinta-feira, 28 de março de 2024

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Luciene Carvalho lança livro sobre as mulheres de 50 em cênica literária no Sesc Arsenal

Foto: Rogério Florentino Pereira/Olhar Direto

Luciene Carvalho lança livro sobre as mulheres de 50 em cênica literária no Sesc Arsenal
Aos 49 anos, Luciene Carvalho se percebeu diferente. As crises existenciais e de relacionamento a lembravam da chegada de uma idade que ela, depois, chamou de ‘invisível’. Seu 11º livro, ‘Dona’, é o resultado de quatro anos de observação, tanto dela quanto de outras mulheres de 50. Nele, poemas revelam as dores, ansiedades e medos de todas essas donas. Na próxima quarta-feira (14), a autora apresenta o trabalho em uma cênica literária, que acontece no teatro do Sesc Arsenal. O Olhar Conceito conversou com Luciene, que contou seu processo de criação, falou sobre feminismo, apoio editorial, e mais. Leia a íntegra da entrevista:

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Olhar Conceito - O Dona é seu 9º livro?

Luciene Carvalho – Não. O Dona é o 11º. E eu tenho uma cartilha que eu fiz sobre dependência química pra secretaria de justiça, que eu considero como livro, que também é escrita em versos. Mas livro é o 11º.

OC – E quando você começou a escrevê-lo? Ou é uma coletânea de coisas antigas?

LC – Não é não. É uma experiência inédita em todos os aspectos. Primeiro porque... eu acho importante falar do processo editorial. Eu hoje tenho um contrato com uma editora parceira, que é a Tanta Tinta, que me convidou pra fazer um trabalho que independesse de projeto cultural. Eu participaria da construção, e participaria dos lucros. Lógico que de uma maneira parcial. Sabe aquele negócio de ‘eu te chamo pra receber preço de capa’, essas coisas que é o sonho da profissionalização? Aconteceu comigo.

OC – E é a primeira vez com esse livro?

LC – Eu tive uma experiência com Insânia, mas a editora fez e administrou, e eu fiquei com alguns livros pra vender. Dessa vez é parceria mesmo.

OC – Você vai ficar com o lucro de venda de todos os livros que forem impressos?

LC – Sim, e com estrutura de site, de eventos à disposição. Mas os lucros não são o foco central. O foco central é ter alguma autonomia fora do que se chama ‘leis de incentivo à cultura’. O que hoje é uma questão muito mais temerária do que antes, né? Mas mesmo no momento em que foi feito... foi feito em 2017 o convite, no dia do lançamento de um livro do Mahon, em que estava estreando também ‘O poder da palavra’. Então foi um momento em que o Ramon [Carlini] me chamou.

Agora eu volto pro livro. ‘Dona’ foi uma escolha, mas não é uma escolha pós edição. Às vésperas de fazer 49 anos eu tive o que eu chamo de ‘despertar espiritual’, um conceito jungiano. Eu vinha de dois anos de crise existencial, relacional, de saúde... porque em mim também reflete em tudo. E eu não entendia o que era aquilo que mexia, que movia, que tudo. E aí eu recebi a visita de um casal de amigos, e eu estava olhando e conversando com um rapaz dez anos mais novo que eu, e não percebi, não passou pelo consciente, foi direto pela boca, e disse pra ele: isso é crise dos 50. E nesta hora eu percebi que era real. E esse ‘é real’ me levou a buscar um ponto mais seguro, um ponto de menos dor. E eu disse: ‘vou olhar isso. Será que é só comigo? O que está acontecendo? O que é isso? Porque tanto medo?’. E eu constatei não só o medo, mas o silêncio.

OC – O silêncio seu ou das pessoas?

LC – O silêncio. E o silêncio você não sabe de quem é. Porque é silêncio, é não manifesto. Aí pensei... o funk fala das ‘novinhas’, as gostosas estão nos 20. Quando chega aos 30, Balzac já falou. Aos 40 é a loba. Mas e os 50? Quem é essa mulher? O que essa mulher sente? O que cheira, o que bate? E aí a construção começou a ficar intensa, e eu comecei a me propor a buscar essas mulheres além de mim. Só pra você ter uma noção, no ônibus: elas não têm 60 pra alguém levantar, mas elas estão muito cansadas. Elas se penduram. Mas tinha uma contrição nova no corpo feminino. (...) Não era mais aquele olhar de caça que eu percebia na poderosa, porque essa tal de mulher dos 40 é extremamente poderosa.

OC – E você percebeu todas essas fases em você também?

LC – Todas. É muito doloroso olhar tanto pra si mesma. Foram quatro anos de olhar pra mim e pras mulheres. Elas passam na construção civil, e nem a construção civil ajuda com assobio. Nada, nem um nome, nenhuma referência, nenhuma atribuição... não tem. E aí eu comecei a temporariamente chamá-las de ‘as invisíveis’. Mas elas existem. Não existe um suicídio coletivo... mas existe. Existe muito câncer de mama, existe muito câncer de útero. E eu comecei a refletir... o que acontece? Acontece a menopausa, e a sociedade judaico-cristã diz que o sexo é procriativo. Uma mulher que deixa de ser procriadora tem direito ao prazer?

OC – E isso tudo você ficou se questionando neste tempo...

LC – Tudo. Quatro anos.

OC – Só pensando ou também escrevendo?

LC – Escrevendo. Se eu continuasse só vivendo, a dor era maior. Porque na poesia eu me refaço, eu me revejo e ressignifico o que eu vivo. Porque aí passa a ter um caminho, uma diretriz. Mas a gente vai olhando o colágeno, a gente vai olhando a pele... tudo foi visto com uma crueza, mas com um destino já.

OC – Você falou que temporariamente você as chamou de invisíveis...

LC – Mas aí eu vi, eu compreendi. O comércio ama essa mulher. Passei na 13, e cada uma delas que eu via passar, o vendedor pulava em cima. Essa mulher de alguma forma tem algum dinheiro. Ela tem o dinheiro do trabalho, ela tem o dinheiro da pensão pros filhos, ela tem o dinheiro da aposentadoria, ela tem um dinheiro porque ela cuida de neto... ela tem algum dinheiro. Ela compra comida, ela é provedora e nutridora. Mas ela também já está num momento em que ela trabalha. A minha geração não é a geração que colocava no penhoar e ia para a cadeira de balanço, o que acontecia lá atrás na década de 70 e 80. (...) E a decisão de: continuo ou não? Porque dentro de mim tinha uma fuga muito grande de relacionamento. De me privar da dor.

OC – Mas escrever te lembrava mais dessa dor?

LC – Eu não queria me relacionar. Eu queria vazar. Queria dar um jeito de esfaquear a relação até a morte. E todas as crises possíveis que eu pudesse romper pra não ter, nesse período, um relacionamento com um parceiro mais jovem. O colágeno nele não me causava inveja, causava temor. E aí vou viver isso, e aí vem o abandono, e aí...mas eu entendia já. Eu já sabia o que era. Eu já tinha tomado uma decisão. Quando o Ramon chamou pro livro, eu falei... aí, rapaz, Dona tem meios... Só que ela não chamava ‘Dona’. Na minha cabeça ela chamava ‘Senhora’, mas tem um cara novato, José de Alencar, que já usou o nome, então ela estava sem nome. E ela estava realmente sem nome. Quem era? O que ela era? E as identidades de Dona já estavam claras. Eu já encontrava elas vendendo pamonha, cachorro quente... a batalha delas.

OC – E você passou a identificá-las em todos os lugares que você ia?

LC – Eu achei. Por exemplo, eu não tenho nada contra quem faz cirurgia plástica, se for uma escolha. Mas também tem amputação nisso. Porque não é uma luta a favor, é uma luta árdua. Porque o tempo é perene, ele vai vencer. E o caminho que eu encontrei foi trabalhar em algum nível a autoaceitação através da observação. Porque eu já estava a favor de mim, se eu estava construindo uma obra.

Enfim... fechei o livro. Compus o livro. Não era um réquiem pra minha surpresa. Nesse ínterim, minha mãe morreu. E isso sim era novo. Eu percebi que elas têm que virar mulher, até porque existe um vácuo. Um monte de mulher de 50 passa pelo luto, seja de pai, seja de mãe, seja de irmão... ou o mais bizarro, porque eu acho que Drummond estava certo quando ele diz que é antinatural um pai morrer depois de um filho, e essa mulher de 50 passa, por vezes, pelo luto de um filho. Mas ela não se mostra. Por vezes é uma máscara... [mas] a pupila contava, e eu achei que tinha chegado num ponto de maturação. Porque fazia sentido escrever sobre isso. Fazia sentido encontrar nome, encontrar padrões... talvez tivesse alguma coisa nova pra contribuir pra esse momento e pra esse movimento feminino. E a coragem aconteceu. A decisão de atravessar esse momento vivendo um relacionamento, observando a eroticidade. Aí eu virei campo de experimento.

OC – Passou a escrever sobre você?

LC – Tudo. Tudo virou. Família, morte de mãe...

OC – Essa questão da sua mãe é bem presente, até porque quando você tomou posse na Academia Mato-grossense de Letras eu me lembro que seu discurso era uma carta pra sua mãe. Como ela está presente neste livro?

Luciene no dia da posse na AML (Foto: Olhar Conceito)

LC – Nesse livro o fio condutor é o diálogo com ela. Eu conto, eu dialogo com ela. Existem momentos de luto, infelizmente, mas é isso que eu estou vivendo. Eu sou uma filha única, e a mãe morre com 50, aos 50 eu tomo posse... a posse na Academia foi um empoderamento importante. Um patamar. Reconhecimento profissional. E eu gosto de lá. Independente do que seja, eu gosto do que significa, porque passou a ter uma representação. Não porque eu tenha atribuído a mim uma representante, não. As pessoas, as mulheres, as negras, o meu bairro, se manifestou no sentido de se sentir representando. E isso dá uma posição de conforto, de suporte.

Mas a eroticidade da mulher de 50 não é essa coisa concessiva ou comercial que se apresenta. A mudança com relação ao desejo manifesto do masculino muda totalmente. Mas ele é recorrente.

OC – Como ele se manifesta?

LC – Ele se manifesta no olhar encantado de vários homens pra mulher mais velha. Encantamento de desejo mesmo, de ‘ai meu Deus, ela sabe umas coisas desse mundo, que eu estou perdido, eu quero ela’. Ou de ‘nossa, você é brilhante’. É muito legal, e eu me sinto amada dentro da relação que eu vivo. Porque foi troca. A pessoa que estava comigo estava sabendo o que eu estava fazendo. Por vezes não gostava de participar de um experimento num nível mais erótico que alguns poemas trazem.

OC – Então você traz coisas de erotismo de dentro do seu relacionamento pro livro?

LC – Não é de dentro do meu relacionamento, é de mulheres de 50, ou pega ou larga, eu estava vivendo aquilo...

OC – Mas você é uma mulher de 50.

LC – Entendeu? É isso. Eu não ia poder chegar pra você, digamos que tivesse 54 anos e perguntar, ‘e aí, como que é?’. Se ela não conseguia falar nem dela... se ela não conseguia falar nem da dor dela com relação aos pés de galinha, ao bigode chinês. Ela não conseguia, não tem isso, é tudo muito fragmentado. Vai na internet que você encontra um monte de remédio milagroso, eu pesquisei. ‘Você volta a ter 30’... isso é a maior negação de todas. Se eu viver procurando um remédio que negue meu tempo hoje,eu estou me matando em algum nível.

OC – Você acha que o discurso de empoderamento da mulher do feminismo chega para essas mulheres da mesma forma que chega para as mais jovens?

LC – Eu acho que vem dessas mulheres. Elas pensaram isso. Elas são as professoras na universidade, na escola, que apagaram padrões sociais da cabeça, discutiram ideias, abriram mentes que possibilitaram o amadurecimento. Mas a reflexão sobre o feminismo no livro ‘Dona’ é chocante. Porque não fala de feminismo. Fala que o homem está morto pelo machismo. O machismo está matando o homem de hoje. Porque ele não sabe como seguir.

OC – Como seguir em que sentido?

LC – Como representar os papeis postos se eles já não cabem mais? Eu acho que minha maneira de contribuir foi paquidérmica. Eu reconheço o movimento, mas o meu discurso passa muito por observar que o homem está perdido, está triste.

OC – Então ele não é o vilão da história?

LC – Eu acho que o machismo machucou todo mundo. No final das contas machucou o pai que espanca, a mulher que apanha e o filho que assistiu. Eu não consigo ver vitória numa pessoa que precisa lançar mão ou da traição, ou da força muscular pra se impor. Isso é muita inferioridade. Existe uma fragilidade de ideias, de pensamentos, e de sensibilidade muito grande em alguém que se impõem pelo feixe muscular. E que passa a receber mais temor do que amor do filho.

OC - Mas qual é o caminho pra acabar com isso?

LC – Acabou. Eu acho que o que tem é resquício. Acabou da forma mais bizarra: o próprio capitalismo acabou. Não tinha outro proletariado, e eles pegaram as mulheres como exército de reserva pra baratear a mão de obra. E a mulher era um exército de reserva imenso chegando, escolarizada na década de 80. Mas aí, a partir do momento em que a mulher tem auto sustento, chega no Brasil, e aí tenho que fazer uma leitura específica, o divórcio também. E as famílias começam a ser nucleadas a partir de figuras femininas.

OC – E muitas dessas mulheres de 50 são as mulheres pós-casamento...

LC – São as filhas do divórcio.

OC – Sobre o lançamento em si... vai ser uma...

LC – Desde Insânia eu não faço uma forma ‘tão’ Luciene. Eu acredito que formação de plateia passa pela oralidade poética. Eu sou fruto da oralidade poética. Eu vim de um Pantanal que não tinha luz, e que as crianças eram postas pra declamar como forma de entretenimento, nas escolas... foi assim que eu comecei. E quando eu fui fazer uma síntese profissional, eu quis trazer a oralidade, até porque eu ganhei os prêmios de festival de música popular na UFMT em 92, primeiro e terceiro lugares, porque eu declamava. Foi a oralidade. E eu acredito que os ouvidos são passivos. O ouvido pode te ganhar. Quem trouxe Castro Alves até aqui? Até os negros que não sabiam nem podiam estudar? Não tinham acesso. Essa poesia chega pela oralidade, numa tradição brasileira. E eu acho que é o que eu tenho de melhor pra contribuir na literatura. Mas foi um esforço. A memória depois de nove anos...

OC – Um esforço pra decorar os poemas?

LC – Pra parar, pra me concentrar pra decorar os poemas. Eu sou outra. Existe uma dificuldade típica do meu tempo. E eu falo de tempo... não é uma abstração. Eu estou falando de tempo vivido. A memória não é igual, a concentração. Talvez a minha memória tenha sido menos atingida do que aquela coisa de sentar, parar e decorar. É difícil chegar.

Foto: Olhar Conceito

OC – Mas além de decorar tem toda a interpretação...

LC – Eu acho que eu coloco como cênica literária porque tem cenário, e não é um cenário doméstico. Sei lá, hiperrealista talvez. E as coisas são como as coisas são, no palco, a serviço da poesia. A serviço do eu-lírico. Então cada poema traz uma força em si. E ele é encadeado de forma ao público entender, nesse momento, a delicadeza. Eu trabalho com o mesmo diretor há muitos anos, desde 2003. Vagton Douglas. Dessa vez a produção é do Raul [Lázaro], a sonoplastia é do Alexandre Mattos, o Emerson está chegando pra trazer algumas imagens, que é uma linguagem que começou no Insânia, mas é diferente dessa vez. A imagem é quase uma tradução. Porque o que é esse espetáculo? É uma colcha de sentidos. O principal é o ouvido? É! Mas eu vou deixar seu olho lá, perdido, triste? Seu nariz? Tudo tem um gosto, um sabor... a gente tem surpresinhas, movimentos inéditos, coragens, riscos, porque decorar é risco, mas é uma forma de dialogar com o público de há muito. São 17 anos fazendo isso. E é um convite também. Eu estou feliz com o alcance. Porque se por um lado o meu ponto de diálogo é com a comunidade mato-grossense dizendo: ‘vamos construir uma carreira literária profissional, sustentável?’. Viver de poesia ainda é uma luta.

OC – Mas você vive de poesia?

LC – Não só. Ainda não só. As últimas administrações de cultura contemplaram minimamente a literatura. E por isso que eu comemoro tanto que a relação editorial alcançou uma maturação profissional. Mas voltando à cênica, eu tenho outra reflexão que mudou muito que é a minha relação com o leitor. As universidades criaram territórios, nichos muito importantes da literatura mato-grossense. Os últimos dez anos foram de pleno crescimento. E isso me faz ter uma relação com o leitor que não termina. Hoje quando eu vejo um livro, sabe aquele errinho natural de revisão e gráfica? Já penso... ah, meu leitor... Eu tomei consciência da existência do meu leitor, porque eles telefonam, eles mandam vídeos do trabalho... a Unemat é monstro nisso. A UFMT foi a que chegou primeiro, de olhar e reconhecer uma obra com consistência.

OC – E você tem essa resposta e esse contato mais próximo com quem está te lendo?

LC – É mais que isso. Eu tenho um canal. Hoje quando eu vejo um livro, eu tenho a consciência do meu leitor. Não é uma coisa só minha e de expressão. Porque eu sou uma pessoa muito abençoada midiaticamente, não tem outra palavra. Desde o primeiro momento eu fui vista. (...) eu sou alguém que a imprensa levou. Parte dos territórios que eu alcancei, vieram porque foi uma decisão midiática. (...) Eu vou chegar onde eu tiver que chegar através da academia e da mídia da minha cidade.

OC – No lançamento do livro você vai declamar todos os poemas?

LC – Treze.

OC – E tem quantos?

LC – Não sei... chegou ontem. Passei a madrugada inteira com o neném (...). O que eu acho que tem de mais revolucionário nisso é que Dona achou um nome. E é um nome que contempla o que a mulher de 50 pode ser. Dona de si. Dona do tempo dela. Dona do corpo dela. Dona da fé, que é dela. Que é uma ferramenta bem importante na relação não só com o divino, [mas] com ela própria, como fonte de força. Não estou falando de religiosidade, estou falando de fé. Porque Dona tem fé nela. Quando ela se coloca como ‘Dona’, o nome empodera.

OC – Como você chegou neste nome?

LC – No banheiro, no chuveiro. Eu estava desesperada porque ‘Senhora’ não dava pra ser...

OC – É uma brincadeira com a palavra...

LC – Não é uma brincadeira. É uma forma de unificarmos todas. Mas também é uma ponte. Tem aí um diálogo assim, este livro tem uma orelha de Mário César, apresentação de Marília Beatriz, e tem prefácio de Maurília Valderiz. E tem um poema da Lígia Silva. A Lígia Silva tem trinta e poucos. A Marília está com 70. Valderiz, com 60. Mario César é LGBT. Então a gente está falando de ‘Dona’ que, às vezes, tem @. Eu estou dialogando com todas as mulheres, os percursos... são eles que me apresentam. Então tem uma consciência muito grande na construção. Cada pessoa dessa que eu convidei tem um sentido. Eu gosto da ideia de apresentar uma poesia inédita. Eu acho que é a forma que eu tenho de convidar poetas, poetisas, escritores a se lançar no cenário também. Então são vários cuidados. Esse foi um livro de consciência de invernos, consciência de verões, consciência de buscas de outono, memórias de primavera... as temporalidades. Apesar de eu achar que o tempo é velho e eterno. Nós é que chamamos o tempo ao fragmento que damos. Mas a gente não vive o tempo que passa. O tempo é um estado pra mim. Eu estou no tempo. O tempo é meu cenário. Eu é que passo. Ele fica. Ele é perene. Eu nunca vi o tempo se contando.

OC – Nós é que contamos...

LC – E ele velho, perene, forte, poderoso e rei fica olhando pras nossas caras e falando: conta. Mas também é dor. Este livro fala da dor. Fala do espelho. Essa transição, de que a mulher não é uma velha, mas não é nova. Ela não é menina. Ela não pode mais se valer dos mesmos recursos.

OC – Mas é uma forma de se descobrir?

LC – Ela se descobre se quiser, né? Porque umas começam a vestir roupas das filhas e problema delas... elas podem competir com as filhas. O livro pra mim foi. Eu estou com 53. Eu estou falando pra você que hoje eu estou com 53. Eu tenho 53 tempos e eu estou com 53 tempos.

OC – As crises passaram?

LC – Nunca passarão. Só vão mudar de tema.

OC – Mas aí são temas pra outros livros...

LC – Eu acho que Dona ainda vai contar. Mas eu não conheço nada na literatura que trate disso. Estou falando dentro de um processo poético. Essa contribuição eu espero trazer. Eu espero que eu possa, num momento, levar esse livro na periferia e descobrir como as mulheres de lá vão lidar com o medo. (...)

Eu não quero encantar com palavras inacessíveis. Eu quero cantar pro meu povo. Eu procurei um verso pela vida inteira, e ele apareceu num poema desse livro chamado ‘periférica’, que fala, ‘Meu verso é parto como o meu país’. É com eles que eu estou procurando dialogar.
 
Serviço


Cênica Literária – Lançamento de ‘Dona’, de Luciene Carvalho
Data: Quarta-feira, 14 de novembro
Horário: 20h
Local: Teatro do Sesc Arsenal
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