Quando foi reinaugurada a Praça Oito de Abril, popular ‘Praça do Choppão’, em dezembro de 2019, alguns artistas criticaram a retirada de um monumento de autoria de Wlademir Dias-Pino e de um mural do artista plástico Adir Sodré. Após as reclamações, em janeiro de 2020, o secretário municipal de cultura Francisco Vuolo garantiu que a obra, titulada ‘‘Árvore de Todos os Povos", voltaria para o local de origem, e que Sodré seria convidado para refazer o mural. As coisas, no entanto, não correram como o previsto: o monumento desapareceu e Sodré faleceu em agosto, após sofrer um infarte. Agora, a solução apresentada pelo prefeito Emanuel Pinheiro (MDB) é a construção de uma réplica da escultura e de uma homenagem ao pintor.
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“Isso foi uma situação muito chata, até como cuiabano de chapa e cruz eu me senti muito chateado com tudo isso, mas eu precisava revitalizar aquela praça, era um local... uma praça como aquela, praça Oito De Abril, um local vibrante de Cuiabá, onde pulsa a noite cuiabana, um dos pontos mais movimentados da noite cuiabana, uma praça morta daquele jeito? Ocupada, via de regra, por usuários de drogas, fonte de insegurança, de desprezo pela cidade...olha a imponência da praça do Choppão hoje? Ela foi devolvida para a sociedade. Você encontra lá crianças, idosos, jovens, adultos, todas as idades! A população está vibrando e voltou a ocupar o espaço público com prazer, melhorando a qualidade de vida e integrando já a solidária população cuiabana”, afirmou o prefeito, em entrevista ao
Olhar Direto na última quinta-feira (1).
“Agora, é claro que isso não pode ser feito desconsiderando a cultura local. Determinei que fosse localizado tanto a tela quanto o monumento, [mas] não foi localizado, não sei o que aconteceu. Com o Adir Sodré nós já estávamos organizando com o secretário Vuolo pra ele fazer uma nova tela, infelizmente[houve] a fatalidade que o tirou do nosso meio. Vamos ter que repensar até uma homenagem ao grande e inesquecível Adir Sodré ali na praça Oito de Abril, que é batizada com o aniversário de Cuiabá. E com o monumento nós estamos... o ex-secretário Stopa, nosso candidato a vice, já está com a missão, o secretário Anderson já está com a equipe trabalhando nisso para fazer uma réplica, nem que não coloque ali onde estava, ou outro local ou mesmo onde estava, que possa fazer uma réplica”.
A escultura-poema “Árvore de Todos os Povos” é fruto do Movimento do Intensivismo e surgiu como resultado de uma nova intencionalidade plástica, artística e literária, ocorrida em Cuiabá entre as décadas de 1940 e 1950. “Muita gente que passa por ali não sabe a importância dessa escultura. O trabalho do Wlademir é estudado por pesquisadores de outros países. Dentre outras coisas, ele foi o primeiro do mundo a criar um livro objeto. Para Cuiabá é uma honra abrigar uma obra de um artista que até hoje é considerado como vanguardista”, afirmou, à época, A diretora da Casa de Cultura Silva Freire, Larissa Spinelli.
As obras foram retiradas durante a reforma da praça. O espaço foi entregue no dia 23 de dezembro de 2019, com reconstrução do piso, pintura, instalação de iluminação de LED, bancos e lixeiras, jardinagem e paisagismo.
Os artistas
Dias-Pino morreu no dia 30 de agosto de 2018, aos 91 anos, no Rio de Janeiro. Ele era artista, poeta, desenhador gráfico, vitrinista. Nascido no Rio de Janeiro, migrou ainda criança para Cuiabá, onde fundou um movimento pioneiro de poesia experimental na década de 40. Ao longo das décadas de 1950 e 60, participou da fundação dos movimentos Poema/Processo e Intensivismo. Ao propor uma leitura do mundo a partir das imagens, sua prática desafia a relação entre imagem e linguagem.
Vladimir Dias-Pino (Foto: Rogério Florentino / Olhar Direto)
Em 2017, Dias-Pino voltou à capital mato-grossense, onde viveu por muitos anos, e trouxe obras para as itinerâncias da Bienal de São Paulo. Na época, quatro placas foram criadas a partir de estilos gráficos dos povos indígenas do Xingu, enquanto outras quatro placas foram baseadas na bandeira do Estado do Mato Grosso, com a estrela amarela como símbolo do poder local.
Adir, por sua vez, nasceu em Rondonópolis (219km de Cuiabá) em 1962. Já em 1977 passou a frequentar o Atelier Livre da Fundação Cultural de Mato Grosso, onde foi orientado por Humberto Espíndola (1943) e Dalva (1935). Nos dois anos seguintes, integrou com Gervane de Paula (1962) e outros artistas, um grupo que procurava renovar a arte mato-grossense.
Adir Sodré (Foto: Rogério Florentino / Olhar Direto)
Participou de exposições coletivas organizadas pelo Museu de Arte e de Cultura Popular da Universidade Federal do Mato Grosso (MACP/UFMT) e também de outras, coletivas: Como Vai Você, Geração 80?, na Escola de Artes Visuais do Parque Lage (EAV/Parque Lage), Rio de Janeiro, em 1983, e Modernidade, Arte Brasileira no Século XX, no Museu de Arte Moderna de Paris, em 1987.
Em sua produção, abordava temas relacionados à cultura regional e questões acerca dos povos indígenas, além e ser lembrado pelos 'falos' e por ter a sexualidade como tema em grande parte de sua obra.
Na Enciclopédia do Itaú Cultural, seu trabalho é apresentado como com "diálogo constante com a tradição da história da arte, e faz referências, entre outros, aos pintores Vincent van Gogh (1853-1890) e Diego Velázquez (1599-1660). Aproxima-se também do universo dos quadrinhos, como em Almoço na Relva VII (1988). A partir da década de 1980, Adir Sodré inclui em suas obras temáticas relacionadas aos povos indígenas, à invasão causada pelo turismo em determinadas regiões do Brasil e ao consumismo, esse último exemplificado no quadro Dolores Descartável (1984)".
O artista é reconhecido nacionalmente por suas obras. Em 2017, um de seus quadros esteve ao lado de Pablo Picasso, Adriana Varejão e tantos outros na exposição 'Histórias da Sexualidade', no Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand.