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No Choppão há 19 anos, garçom potiguar relembra atendimento a celebridades, políticos e 'gringos'

Da Redação - Isabela Mercuri

Foi com apenas 18 anos que o potiguar Jean Carlos Saraiva Teixeira se mudou para Cuiabá, há exatos 20 anos, completados no último dia 28 de agosto. A maior parte deste tempo passou como garçom do Choppão, um dos restaurantes mais tradicionais da cidade. Nesta trajetória, já serviu desde políticos comemorando vitória em eleições, até russos na Copa do Mundo, e famosos como Luan Santana e a dupla Jorge e Mateus, além, é claro, dos clientes fieis. “Pra nós, todo mundo é importante”, afirmou ao Olhar Conceito em uma entrevista realizada na última quarta-feira.



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Jean nasceu em uma pequena cidade do meio oeste de Rio Grande do Norte, chamada Janduís. De lá, foi para Mossoró, e depois para Natal, antes de mudar-se aos dezoito para a capital mato-grossense. Sua mãe veio três anos antes. “A família da minha mãe, os irmãos dela, todos moravam aqui. Eles vieram do Nordeste pra cá na década de 80. Ai meus pais se separaram e a minha mãe veio embora pra cá”. Isso aconteceu em 1995, quando Jean tinha apenas quinze anos de idade.

Em Cuiabá, trabalhou primeiro em uma Companhia de Bebidas como ajudante, durante um ano, mas não estava satisfeito com o salário. Foi aí que uns amigos lhe avisaram da vaga no Choppão. “A princípio entrei lavando pratos. Fiquei uns três meses, vim pro bar, e depois que comecei a trabalhar de garçom. Eu fiz um curso básico no Senai, fui aprendendo, e estou aqui até hoje. Já faz 19 anos”.

Desde o início, o turno do potiguar é o do dia. Ele chega às 10h da manhã e fica até as 18h. Tem uma folga semanal coletiva às terças, e uma vez por mês tem folga no domingo. O domingo é, também, o dia mais agitado, e o que ele mais gosta de trabalhar. “Gosto mais de quando está lotado. A hora passa mais rápido, é mais animado. Durante a semana, tem o movimento do almoço até umas 14h e pouco, depois fica vazio à tarde. Tem um ‘pinga-pinga’, uma mesinha aqui, outra ali, mas às vezes é até um pouco entediante, a hora não passa porque não tem o que fazer”.

Nestas quase duas décadas de trabalho, Jean conta que já viu de tudo no restaurante. Desde acordos políticos que são ‘fechados’ nas mesas do Choppão, até comemorações e campanha. “Aqui a gente escuta de tudo. Escuta e fica quieto. Vai, atende normal, escuta os acertos, mas fica quieto”. Este ‘sigilo’, segundo ele, é um dos principais motivos pelos quais os clientes sentem tanta confiança no local.



Dos artistas que já atendeu, ele quase perdeu a conta. Almir Sater, Jorge e Mateus, Ana Maria Braga, Marrone, Renato Teixeira... “Eles sentam normal, como cliente. A gente atende normal também. A única pessoa que eu atendi que queria alguma coisa diferente foi a Adriana Bombom, ela queria um prato diferente e não tinha, mas nada fora do normal”, lembra.

O único que precisou de ‘atendimento diferente’, segundo ele, foi o sertanejo Luan Santana. “Ele veio de madrugada, entrou aqui e estava muito lotado. O pessoal foi todo em cima dele pedir autógrafo. ele queria jantar, e não teve como. Aí o gerente teve uma ideia, e o levou lá pra cima, pro nosso refeitório, e o serviu lá. Depois que ele acabou de jantar, mandou os clientes fazerem uma fila pra subir, e deu autógrafo pra todo mundo”.

No entanto, uma das épocas que mais marcou Jean foi a Copa do Mundo. O Choppão chegou a contratar um intérprete, mas na maior parte do tempo eram os garçons que tinham que se comunicar, mesmo que na base da mímica, com os turistas estrangeiros. “Quase não tivemos dificuldade. A gente teve dificuldade, um pouquinho, com os russos. Porque eles falavam inglês, mas não entendiam bem. A gente tinha cardápio em inglês e espanhol. No primeiro dia tivemos um pouco de dificuldade, depois fomos nos adaptando, conhecendo, e desenrolamos bem”.

No dia a dia, Jean atende os cuiabanos, e já fez amizade com aquelas ‘figurinhas carimbadas’. “Tem gente que vem toda sexta, tem cliente que vem todo domingo, tem cliente que vem duas, três vezes por semana, tem cliente que vem duas, três vezes por mês, tem os clientes cativos que vem sempre. Aí a gente já sabe o que eles vão beber, e às vezes quando eles vão entrando, nós já levamos a bebida, já conversamos... lógico, mantendo o respeito de garçom-cliente, mas a gente brinca, conversa, tem uma amizade, é uma coisa prazerosa”.

Apesar da saudade de casa, o potiguar afirma que já se sente cuiabano, e não pretende voltar. “Eu gosto muito do meu estado. Cresci lá, vivi até os dezoito anos de idade, mas ontem, dia 28, fez 20 anos que estou em Cuiabá. Então eu já me considero cuiabano. Eu gosto daqui, sou adaptado aqui, então no momento não penso em voltar pra lá pra morar. Gosto das amizades que fiz aqui, [é] um pessoal muito acolhedor, muito bom. Gosto da cidade, é uma cidade boa pra se morar, tranquila. Em comparação às demais capitais do Brasil, é uma cidade tranquila, onde você pode andar na rua sem ficar se preocupando. No meu estado mesmo era tranquilo, mas hoje é um dos estados mais violentos do Brasil”, lamenta.
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