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Transfobia no “BBB”: é cansativo ter que se explicar sempre, diz artista de MT

Da Redação - José Lucas Salvani

Cantora e atriz, Linn da Quebrada sofreu inúmeros atos de transfobia desde que entrou na casa mais vigiada do Brasil. A participante ouviu brothers e sisters a chamando pelo pronome errado e até mesmo de traveco. As “pequenas” violências cresceram ao ponto de que, no último domingo (23), Tadeu Schmidt abriu espaço para que Lina pudesse explicar a importância de se direcionar a ela da forma correta, o que pegou muitos de surpresa.

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O momento rendeu elogios dos espectadores nas redes sociais, mas levantou o questionando de muitas pessoas transsexuais de que uma população marginalizada pela sociedade precisou se explicar mais uma vez. O artista de Várzea Grande, Sol Ferreira conta em entrevista ao Olhar Conceito que precisar se explicar sempre para pessoas cisgênero — aqueles que se identificam com o gênero determinado no nascimento — é bem cansativo.
 


“Essas explicações nós damos todos os dias. O tempo todo estamos nos explicando e ensinando as pessoas sobre os significados das coisas, educando para que revejam seus conceitos. Isso acaba gerando um ambiente muito cansativo para nós em muitas instancias”.

Atriz, Lupita Amorim ressalta ao Olhar Conceito que as pessoas transsexuais mesmo violentadas precisam se explicar ao mesmo tempo. “Temos esse trabalho duplo. Ela foi violentada e precisa ter paciência para ensinar as pessoas. Muitas de nós sabemos que é a partir do diálogo que vamos conseguir mudanças reais, mas pense o nosso lado: somos constantemente violentadas e ainda sim precisamos ser duas vezes mais fortes para educar essas pessoas”.
 
Sol Ferreira

Sol ressalta que as pessoas vão muito de encontro ao senso comum, a forma que são ensinadas a tratar as pessoas transsexuais, mas são incapazes de enxergar o óbvio. Para o artista, o uso equivocado do pronome pode ser evitado apenas observando como a pessoa se comporta e se apresenta. No caso de Lina, acima da sobrancelha esquerda há tatuado “ELA”.

“Sua imagem propõe coisas óbvias. A própria tatuagem descreve como ela se reivindica. Se você é uma pessoa que age pelo senso comum e não é capaz de observar o óbvio em algumas imagens — no caso, estamos falando da imagem de uma pessoa, como ela se apresenta, então você se contradiz. Leio o senso comum como algo contraditório”, pontua Sol.

“Não dá pra dizer que em todos os casos as pessoas agiram de maneira maldosa, mas não dá para negar que foram falas transfóbicas. Existem nuances de sentimentos, evidentemente, enquanto as pessoas estão vivendo. Existem intenções diante de cada fala, mas não deixa de ser transfobia”, continua o artista.

Um dos momentos apontados como transfobia pelo público foi uma brincadeira da participante Laís, que enviou um torpedo para Lina, perguntando: "Tá solteiro?". Nas redes sociais, diversas pessoas apontaram que mesmo referenciando uma fala da própria Linn, Laís poderia ter utilizado o pronome correto. Na segunda-feira (24), Laís explicou suas intenções à cantora que confessou ter ficado sentida com a situação inicialmente, mas entendeu o que a participante queria dizer.
 
Lupita Amorim

Para Lupita Amorim, graças a participação de Lina, o Brasil está podendo acompanhar o dia-a-dia de uma pessoa transsexual. Para ela, o comportamento dos participantes se torna um reflexo de uma sociedade brasileira que não está acostumada a conviver com pessoas transsexuais.

“Isso demostra que as pessoas não estão habituadas [com pessoas trans]. As pessoas não convivem com pessoas trans no seu dia-a-dia. Isso fica muito restrito a nossa comunidade. Todas as pessoas que convivem com transsexuais sabem que isso infelizmente acontece diariamente: nos chamarem das formas que elas nos leem e não como a gente quer ser tratada”.

A exposição das violências sofridas por Lina na casa acabaram se tornando uma consequência de sua participação no “Big Brother Brasil”. Todo o país pôde ver ao longo da última semana a insensibilidade de alguns participantes, o que acaba gerando gatilhos para algumas pessoas da comunidade transsexual que optam por evitar assistir.

“Muitas vezes, os episódios de transfobia que passam são de coisas que a gente já viveu ou que enfrentamos todos os dias. Não precisamos passar por isso, mas acaba sendo uma realidade. [Então] para muitas pessoas se torna um gatilho, uma ativação de sensações e emoções que não fazem bem. Muitas pessoas falam que evitam consumir alguns vídeos que são repostados por causa disso”, pontua Sol.
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