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"É de graciosidade que falamos aqui", diz professor da USP sobre poeta cuiabano

Da Redação - Stéfanie Medeiros

Ele já ganhou dois prêmios nacionais pelo seu trabalho, já foi comparado a Carlos Drummond de Andrade e publicou, mesmo com apenas 21 anos, três livros. Agora, a poesia de Matheus Jacob Barreto é novamente alvo de elogios do professor Nelson Luís Barbosa, doutor em Letras pelo Departamento de Teoria Literária e Literatura Comparada da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP).

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Desta vez, o professor avalia em um artigo uma seleção de poemas de 2012 a 2015 feitos pelo próprio Matheus. “Eu fiz uma pequena seleção de poemas que representam o que eu criei neste período de tempo. Alguns são inéditos e outros foram publicados em jornais ou em meus livros. Acho que essa seleção é o melhor resumo do que fiz nos últimos três anos”, contou Matheus ao Olhar Conceito.


(Segunda edição do livro "É", de Matheus Jacob, publicado pela editora nacional Scortecci)

“Já tive a oportunidade de expressar que na poesia de Matheus Jacob Barreto percebe-se claramente um diálogo com a mais fina tradição da poesia brasileira, de Drummond (uma quadrilha nova), de Bandeira (para lá para cá / a mão de mãe da mãe), de Cabral (o bastão não se passa a ninguém na corrida) – mas não é algum diálogo estéril que apenas retoma os mestres e os reverencia, e sim um diálogo que determinantemente se insere numa linha contínua de tempo, fazendo prosseguir esse modo de dizer e sentir a vida, as coisas, a própria insuficiência do viver e do fazer poético como um modo de compensar toda inutilidade da vida. E nisso a juventude de Matheus é um alento sem fim”, escreveu o professor no artigo “É de graciosidade que se trata aqui”.

Atualmente, Matheus Jacob está em intercâmbio na cidade de Heidelberg, na Alemanha. O jovem poeta estuda letras na USP, mas passará o ano em uma universidade onde estudaram 55 ganhadores do Prêmio Nobel. Para ver a seleção de poemas 2012-2015 completa, clique AQUI.


(Lançamento do livro "É" na Academia Mato-Grossense de Letras/ Foto: Danilo Bezerra)

Confira o artigo do professor Nelson Luís Barbosa na íntegra:

É de graciosidade que se trata aqui

Muitos são os pontos de observação da poesia de Matheus Jacob Barreto: é possível senti-la de cima para baixo, assim como de baixo para cima; de lado; ao lado e entre; e como “entre dois momentos” – entre-lugares, incômodos ou bem acomodados apesar de apenas para ouvir o som, que aos poucos vai se tornando uma sonoridade, como um canto – letra, música e harmonia – ou um silêncio; na linha contínua do verso como na construção vertical de sua sintaxe; de fora para dentro, mas também de dentro para fora; como num mergulho profundo ou numa volta à superfície para tomar mais ar e prosseguir na observação – às vezes, mesmo de um único e sonoro verso/verbo: “Falhamos”.

Tanto no verso único, abandonado na linha do tempo e do espaço, como numa sequência de profusão de versos divididos em partes, o fôlego do poeta no entanto é sempre o mesmo: pela densidade daquilo que seus versos carregam e pelo que deixam ser carregado nessa apreensão/observação – e nisso a poesia também se realiza.

Do movimento de uma delicada “cantiga de ninar um futuro” à estupefação da inutilidade de um existir – tudo embala, leva e traz sentidos, sons e sentimentos renovados por uma sintaxe cuidadosa, como o ofício de um ourives a manipular uma pinça muito certeira, ou de um alfaiate que corta com precisão a fina fazenda e depois une as partes escondendo a costura; ou como um pedreiro que, ao assentar as pedras, os tijolos e o concreto vai retirando os andaimes que sequer fazem supor sua preexistência para dar lugar à construção que se observa.

Já tive a oportunidade de expressar que na poesia de Matheus Jacob Barreto percebe-se claramente um diálogo com a mais fina tradição da poesia brasileira, de Drummond (uma quadrilha nova), de Bandeira (para lá para cá / a mão de mãe da mãe), de Cabral (o bastão não se passa a ninguém na corrida) – mas não é algum diálogo estéril que apenas retoma os mestres e os reverencia, e sim um diálogo que determinantemente se insere numa linha contínua de tempo, fazendo prosseguir esse modo de dizer e sentir a vida, as coisas, a própria insuficiência do viver e do fazer poético como um modo de compensar toda inutilidade da vida. E nisso a juventude de Matheus é um alento sem fim.

Tchékhov, certa vez, ao se dirigir a Górki numa carta para lhe falar de sua obra, alerta-o para o que considera “falta de contenção” ou de “graciosidade”, e define este termo assim: “Graciosidade é quando, numa determinada ação, alguém utiliza o mínimo de movimentos”. Certamente é de graciosidade que falamos aqui, como se pode perceber nos poemas “Curto e azul” ou “com a boca cheia de silêncios”.

Obrigado, Matheus Jacob Barreto, pela oportunidade de lê-lo e por me obrigar a pensar sobre a graciosidade da vida.

*por Prof. Dr. Nelson Barbosa
(Doutor em Letras pela FFLCH-USP, Departamento de
Teoria Literária e Literatura Comparada.)

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