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Notícias / Tecnologia

'Você não vai levar seu CD de plástico para o túmulo', diz diretor do Deezer

G1

 O diretor do Deezer no Brasil usa uma imagem que pode chocar ao explicar a diferença entre comprar um CD e aderir aos serviços de streaming de música. "Você vai acabar levando seu CD de plástico para o túmulo quando morrer? Não, você quer fazer festa com seus amigos e poder ouvir a música que qualquer um quiser. É isso que vale na vida", brinca Mathieu Le Roux, em entrevista ao G1.

O Brasil é um dos cinco mercados prioritários para a empresa francesa. Esse modo de distribuição, uma transferência continuada de dados e que não guarda arquivos em celulares e computadores, vem crescendo no país, a ponto de já deixar os downloads para trás no 1º semestre deste ano.

A pirataria, diz Le Roux, já ficou para trás. O desafio agora é convencer uma geração acostumada a baixar música ilegalmente a ouvir canções --mesmo sem pagar-- em uma plataforma dessas. Leia os principais trechos da entrevista abaixo:

Qual a principal mudança trazida pelo streaming?

A grande maioria não volta pra pirataria. O serviço é melhor. Quando eu era estudante, baixei pra caramba música pirata. Era fantástico. Eu tinha uma loja infinita de tudo e era de graça. Só que hoje em dia, comparando com o hábito da pirataria, o streaming é muito melhor. Tem tudo na nuvem, tem o catálogo oficial, não tem que se preocupar com vírus, qualidade de compressão. Pode fazer playlist, está tudo integrado com rede social, não tem que se perguntar, "Onde eu baixei essa versão da música Madonna?" ou "Baixei essa, ouvi uma vez e detestei; ocupou espaço pra nada".

O streaming está vencendo o hábito da pirataria por ser mais fácil. O argumento ético e moral tem impacto, mas o verdadeiro impacto é por facilitar a vida do usuário e tornar a experiência melhor.

Por isso, vemos que todas os países que adotaram essa forma de consumir música, a Escandinávia, a França, a pirata acabou. Quem fala que pirateia música passa por bobo.

E os downloads legais? O streaming tende a reduzir os downloads legais?
Não vamos nos esconder. Também é fato que quem baixava de forma legal, pode achar o streaming melhor. Pode ter aqui uma canibalização. No brasil, essa parte do download legal era um micro mercado. Não é que a gente está tirando ou acabando com uma montanha de dinheiro que iria demorar para remontar. Nos EUA, pode ser diferente, mas aqui não tinha apelo.
Para as gravadoras, é uma mudança de fluxo de caixa. Em vez de ganhar quando lançar o CD, ganharão cada vez que a música é tocada. Se você faz um hit, vai ganhar o mesmo, mas ao longo da vida. Antes, ganhavam quando o CD era lançado e depois não. Hoje, você ganha cada vez que a música é tocada pelo resto da vida. Muito mais justo.
Quais são os desafios no Brasil?
Um dos desafio no Brasil é a qualidade do 3G, apesar das funções offline. Outra dificuldade é a capacidade de pagar, porque cartão de crédito não é tão comum como nos países mais desenvolvidos.
Há dificuldade de compreensão sobre o que é streaming?
Isso não é só no brasil, ocorre no mundo inteiro. É fato que nós estamos numa fase de explicação, porque o streaming ainda é um conceito novo. Da mesma forma que o Netflix teve que mexer com a cabeça de quem comprava DVD ou alugava na Blockbuster, a gente também tem que explicar.
Quando você fala, por exemplo, que a pessoa terá acesso a 35 milhões de músicas e poderá baixá-las, aí a pessoa pergunta, "O que acontece se eu parar de assinar?". A gente explica que todas as playlists vão ficar salvas mas não vai ter o recurso offline. Mas é claro que você vê os espertinhos dizendo, "Legal, vou assinar um mês, baixar tudo e depois deixar de assinar". Mas não funciona assim. Baixar é poder ouvir offline dentro do app.
Na verdade, é um aluguel de música. Mas o que importa na vida? A experiência ou a posse? Você vai acabar levando seu CD de plástico para o túmulo quando morrer? Não, você quer fazer festa com seus amigos e poder ouvir a música que qualquer um quiser. É isso que vale na vida.
O caso da Apple é fantástico, porque tem um keynote do steve jobs de 2003 falando, 'a gente fez estudo e as pessoas não vão querer alugar música, vão querer comprar'. é engraçado, porque o próprio steve jobs dizia que o que o usuário quer não vale nada. a gente acredita que a apple acabou mudando de modelo e acabou seguindo nosso passo.
O streaming molda o comportamento da pessoa que ouve música?
Eu acho que o streaming é uma mistura do comportamento de quem comprava CD pra ter uma coleção de álbum e de quem fazia playlist, coisa que nasceu com o K7, e do de quem ouve rádio, em que você só quer ouvir música e deixar alguém fazer a curadoria por você.
A gente tentou agregar todo esse tipo de atitude. Uma outra coisa que faltava era ouvir papo, e isso a gente está integrando agora com o podcast, faz parte de experiência.
Mas nunca na história os usuários tiveram acesso a tanta música. Abriu totalmente as fronteiras que havia numa loja física -- aqui no Brasil, algumas tinham 300 CDs, muito pouco. Então, os usuários podem ir atrás de uma música de nicho do outro lado do mundo.
A gente vê alguns serviços morrendo após conflitos com gravadoras, como o Grooveshark. Como o Deezer encara isso?
Quando o Deezer foi criado era igual ao Grooveshark. O fundador, o Daniel Marhely, fez isso com 20 anos. Ele criou um site para resolver o problema dele: não aguentava mais conectar o iPod no computador e pensou em colocar todas as música na nuvem. Como ele discotecava, bastava chegar ao lugar da festa, perguntar se tinha internet e pronto.
Alguns meses depois, tocou o telefone e era uma gravadora, perguntando: 'Você tem noção do que é direito autoral?'. Claro que ele tinha, só não esperava uma ligação tão cedo. Ele tinha vontade de fazer uma empresa grande e para isso tinha que fechar acordos com gravadoras. O primeiros vieram entre 2007 e 2008. Todo esse esforço, o grooveshark nunca quis fazer.
É fato que eu participo de uma empresa cujo ganha pão é disponibilizar um catálogo que não foi inventado por nós, mas foi criado, produzido e trabalhado por milhões de artistas que merecem ganhar muito mais que eu com essa parada toda.
Há críticas, mas quando tiver 300 milhões de usuários assinando streaming a US$ 10 por mês, vai ser difícil encontrar artista que queiram sair desse negócio porque todo mundo vai querer participar.
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