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Segunda-feira, 29 de abril de 2024

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Grand Central e as duas formas de se matar um homem

Arquivo Pessoal

Gary (Tahar Rahim) nada tem a oferecer que não a sua força de trabalho. É rapidamente apresentado como um inculto e reles malandro diante de uma oportunidade obscura de emprego: uma usina nuclear. O caráter social é sobressaliente nas relações e condições de trabalho vistas em Grand Central (2013), da francesa Rebecca Zlotowski. Mas não vemos ali um sci-fi, nem mesmo o engajamento incisivo do cinema político.

Para trazer novos elementos ao drama, Zlotowski lança mão da prominente Léa Seydoux, recentemente premiada com a Palma de Ouro, no último Festival de Cannes, pela atuação inigualável em Azul é a Cor Mais Quente (2013) Seydoux vive a lasciva Karole, vizinha e colega de trabalho de Gary. Gary obviamente não está imune às virtudes e atributos de Karole. O envolvimento, a priori sexual, tem um entrave singular, talvez, é claro, não tão singular assim para o cinema e a literatura: a moça é noiva de um homem forte e aparentemente agressivo, Toni (Denis Ménochet).



Ficam evidentes, simultaneamente, enquanto perigos ao rapaz: a radioatividade que seu obsceno ofício lhe expõe e o amor desfrutado entre as pernas de Karole. A eminência da descoberta e reação violenta de Toni, e ainda, a exacerbada contaminação radioativa no corpo de Gary, com o inevitável desemprego decorrente, adicionam suspense a trama em doses não mais que moderadas, todavia pertinentes.

Ao depender de forma singular das atuações o filme não escorrega, pois os três personagens citados ganham interpretações ímpares, sobretudo, por Tahar e Léa. A direção prefere o implícito, mais sugere do que mostra. Ao menos, não soa censurada. O roteiro tem momentos interessantíssimos, como na passagem para o último ato, quando Toni descobre a traição, mas não apresenta toda a complexidade que, aparentemente, poderia ter sido explorada na dualidade proposta. Este dois problemas são quase inesgotáveis quanto à abordagem artística e filosófica, as múltiplas e irremediáveis chagas de um único amor e a covarde e impetuosa relação oferecida pelos senhores, patrões e chefes supremos desde os tempos do feudo. Duas formas de matar um homem.



Por fim, Grand Central é um filme interessante, uma experiência válida, não necessária com é o já citado Azul é Cor Mais Quente. Talvez seus acertos e erros fiquem mais evidentes perante olhares voltados à sua potencialidade, certamente não alcançada.

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