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CÍRCULOS: O cinema independente Europeu e a falta de espaço junto ao público nacional

25 Mar 2014 - 14:41

Especial para o Olhar Conceito - Thales de Mendonça

CÍRCULOS: O cinema independente Europeu e a falta de espaço junto ao público nacional
Muitos são os filmes em reação em cadeia, onde uma atitude apresentada no inicio da trama carrega o suspense dos acontecimentos até seu desfecho e as informações são relevadas no decorrer da história. Mais preocupados com a reação de seus personagens à situação em que se encontram, estes trabalhos conduzem seus espectadores às cegas em busca da resolução de sua trama. “Círculos” o mais recente filme do diretor sérvio Srdan Golubovic, não busca resoluções, mas novos questionamentos a respeito do caráter de seus personagens.

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Com pouca visibilidade no Brasil devido ao peso das produções norte americanas no país durante muitos anos, o cinema do leste, sudoeste e norte europeu foi negligenciado pelas plateias brasileiras até o final dos anos noventa e inicio dos anos dois mil. Com a exceção de algumas produções que ganharam o âmbito internacional devido à sua excelência, e do trabalho autoral de seus diretores, poucos foram os filmes que ganharam conhecimento do grande público nacional. Diretores como Krzysztof Kieslowski (Trilogia das Cores), Thomas Vintenberg (Festa de Família, A caça), Michael Haneke (Violência Gratuita, A fita Branca) e Lars Von Trier (As Cinco Obstruções, Ninfomaníaca) abriram o espaço nos festivais para estas obras até angariar seu lugar junto aos filmes americanos nas Bilheterias dos cinemas nacionais.

           
        (“Os Homens que Não amavam as Mulheres – 2009” “Deixe ela entrar – 2008” “A caça – 2013” “O sétimo Selo – 1957”)

Os escandinavos “Os homens que não amavam as mulheres” de Niels Arden Oplev, “Deixe ela Entrar” de Thomas Alfredson, e o mais recente “A caça” de Thomas Vintenberg são hoje sucessos internacionais e alguns ganharam seus próprios remakes americanos, mas Ingmar Bergman, diretor responsável pela inserção da Suécia no cinema mundial com seus trabalhos ímpares e essenciais à história do cinema – “O sétimo Selo” “Persona” “Morangos Silvestres” -, não teve a mesma recepção e apesar de seu prestígio internacional, teve pouco espaço dentro nas bilheterias latino americanas. Se mesmo filmes americanos do âmbito independente custam a chegar aos cinemas brasileiros, o cinema independente europeu não está melhor.

Ainda destinados apenas aos poucos festivais nas grandes capitais, filmes gregos, suecos, dinamarqueses e austríacos lutam pelo pequeno espaço aberto pelos grandes diretores e que tem se mantido devido a qualidade de seus trabalhos. Entre todas essas obras de grande qualidade negligenciadas pelo público que ainda resiste à oposição cultural apresentada por essas obras, filmes como “Círculos” merecem ser trazidos à tona. Srdan Golubovic, talvez o mais famoso diretor sérvio é pouco comentado por aqui. Com mais de 87 indicações e premiações graças a excelência de seu cinema, seu mais recente filme veio ao Brasil em uma exibição no festival Internacional de cinema de São Paulo, em 2013.

A trama, que se situa na Alemanha, Bósnia Herzogovina e na cidade de Belgrado, gira em torno dos envolvidos em um trágico acontecimento anos atrás em suas vidas. Apresentando a vida dos personagens sem muitas informações, o filme acompanha os desdobramentos das atitudes e escolhas de seus personagens mediante a um acontecimento fatal. Durante a guerra em 93, um soldado Bósnio ajuda um estrangeiro contra um grupo de soldados violentos. No futuro, sua mulher, seu pai, os soldados e o estrangeiro salvo, vão guiar suas vidas sobre as consequências de sua escolha.  

 

Preocupado com a veracidade de seus personagens, Srdan busca em seus atores uma atuação simples e sem muitas exaltações. Comedidos e reflexivos, seus personagens transitam pela arquitetura dura e a fotografia árida da paisagem inóspita e embasbacante, tentando se livrar dos sentimentos que os mantém nestes eternos círculos viciosos. “Quando uma pedra bate na água, ela forma círculos, e esses círculos se propagam, transformando tudo” diz o pai do soldado tentando entender os reflexos da atitude do filho.

Com uma trilha sonora minimalista que se resume aos poucos barulhos do Alaúde, característico da região, e que define o tom da trama em seus momentos mais poéticos e com diálogos comedidos e pontuais. Srdan intercala entre a movimentada câmera na mão e planos sequenciais para dar o ritmo da ciranda circular em que transita seu drama. O filme, que nunca abandona seu clima de suspense e seu ritmo ágil apesar da história dramática, o mantém aflito e envolvido com os dramas pessoais deste país tão distante, mas que nas mãos de Srdan conversa com nossos dilemas, os transformando em dilemas universais.

       

Sem um desfecho próprio, mas com diversos desfechos que não se completam, o diretor evita encerrar o ciclo e abre sua trama para outras direções. Distantes da sombra dos antigos acontecimentos, seus personagens terminam nem melhores ou piores do que iniciaram, mas longe do círculo que os estrangulava. “Círculos” confirma a qualidade deste cinema negligenciado pelo nosso país, e clama para nós expandirmos nossas mentes e sairmos dos círculos em que nos encontramos.


*Thales de Mendonça tem 22 anos, estudante de Cinema e Filosofia, trabalha com edição e criação de roteiros em São Paulo. Viciado na sétima arte, não fala de outra coisa senão filmes e seus desdobramentos na sociedade. Chato de carteirinha ama cinema asiático, filmes com banho de sangue e dramalhões pra chorar aos domingos.

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