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A Grande Beleza: O cinema, a arte e a sociedade numa crítica que busca pela essência do belo

01 Abr 2014 - 15:05

Especial para o Olhar Conceito - Thales de Mendonça

Foto: Reprodução

A Grande Beleza: O cinema, a arte e a sociedade numa crítica que busca pela essência do belo
Vencedor do Oscar® de “Melhor Filme Estrangeiro” este ano, “A Grande Beleza”, o mais novo trabalho do diretor do singular “As consequências do Amor” Paolo Sorrentino, revisita o antigo cinema neorrealista italiano, flerta com o onírico e inventivo universo de Frederico Fellini e visita recantos do cinema crítico europeu para tecer sua crítica poética à sociedade, a arte e a frivolidade da bela vida que levamos.

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Democrático em essência, o cinema possibilitou à sociedade uma nova maneira de dialogar com o grande público e de gerar reflexões a respeito da vida que nos cerca. Ligado diretamente a um propósito social, o cinema europeu já em seus primeiros anos demonstrou seu poder em propagar ideias. Do cinema político russo de Dziga Vertov, Sergei Eisenstein e Vsevolodov Pudovkin, ao neorrealismo italiano e sua preocupação em retratar a sociedade e suas lamúrias e dramas sociais como em “A terra treme” de Luchino Visconti, “Paisá” de Rossellini ou “Ladrão de Bicicletas” de Vittorio de Sica, o fazer cinema mutou-se e descobriu-se em diversas montagens, cortes e as mais diversas experimentações.


(“Ladrões de Bicicletas ” “Paisá” “A Terra Treme” “Oito e meio”)

Nos anos 60, durante a torrente de visões pessoais que surgiram buscando novas significâncias para o cinema e preocupados em abdicar das antigas estruturas, consideradas insuficientes para retratar a visão do cineasta moderno, diretores como os inventivos Michelangelo Antonioni, Jacques Tati e Frederico Fellini conseguiram espaço para suas críticas sutis à sociedade europeia e aos conceitos do pós-guerra. Em trabalhos como “A vida é Bela” e “Oito e Meio” cínicos e visualmente estonteantes, Fellini misturou críticas à alta sociedade italiana e aos conceitos que fundamentavam Roma com uma montagem inventiva e inovadora entregando um espetáculo visual ácido e genial.



Revisitando o cinema de Fellini preocupado em definir sua própria identidade, Sorrentino retrata Roma e a decadência de uma cidade milenar pelo mesmo viés ácido e visualmente estarrecedor. Iniciado com um turista que desmaia ao fotografar a cidade, o filme recheado de imagens poéticas e repletas de interpretações, constrói um panorama da cidade que “sempre acontece alguma coisa” e “nunca há nada de novo” nas palavras do protagonista, Jep Gambardella.

Jep, escritor famoso por seu único romance escrito há vinte anos, vive da fama e do prestígio conquistado por sua obra entre festas, jantares, e exposições artísticas regadas à muita bebida e drogas e música em alto volume. Ele, cínico e alheio ao círculo social que o cerca, tem sentimentos do passado trazidos à tona com a morte de um antigo amor. Vagando entre a fauna de pessoas que povoa Roma, Jep deseja escrever outro livro, mas não se inspira.

O filme então acompanha o protagonista em suas andanças pelos quatro cantos da cidade, seus encontros com as mulheres, e sua apatia em relação a suposta beleza apresentada em cena. Enquanto nos embelezamos com montagens visuais extraordinárias, Jep é embalado pela melancólica trilha que separa seu personagem em uma solidão silenciosa em meio aos barulhos eternos na cidade.

Preocupado em não tornar o filme uma divagação sem sentido repleta de imagens vazias, Sorrentino mantém os diálogos constantes e repletos de críticas aos artistas, aos cineastas e todo o conceito de beleza por trás da arte. Em uma sequência onde uma multidão de magnatas em uma festa admira uma menina jogar tintas numa tela e alegar arte moderna, Sorrentino evoca análises quanto aos bizarros prazeres da alta sociedade e questões quanto a arte e a deficiência daqueles que o fazem em perceber sua carência de conteúdo. Para Jep, a beleza hoje alcançada é vazia e carece de algo que a torne grande.

Rodeado de personagens saudosistas, enigmáticos, conservadores e revolucionários, catedrais maravilhosas, jardins colossais e amantes em fontes de mármore, Jep parece ter em mãos conteúdo para o romance perfeito, mas vê nesse excesso de lirismo e pompa uma falta de essência. Com tempo suficiente para criticar também a religião – estamos em Roma afinal – a moda, a pizza, e até mesmo o cinema italiano, Sorrentino e Jep não poupam esforços em emular os primórdios do cinema crítico ao não deixar pedra sobre pedra em sua busca pela grande Beleza primordial à sua inspiração.

*Thales de Mendonça tem 22 anos, estudante de Cinema e Filosofia, trabalha com edição e criação de roteiros em São Paulo. Viciado na sétima arte, não fala de outra coisa senão filmes e seus desdobramentos na sociedade. Chato de carteirinha ama cinema asiático, filmes com banho de sangue e dramalhões pra chorar aos domingos.



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